quinta-feira, 18 de novembro de 2010



DEPOIMENTO DO MÉDIUM EDSON GOMES MAGALHÃES SOBRE A DONA DIDI

Edson em sua residência, 15.11.2010.
Conheci a Dona Didi em 1973. Eu tinha terminado o meu segundo grau, estava noivo e adoeci. Então, fui ao Centro para consulta, conduzido por minha mãe, quando já estava desenganado pelos médicos. Minha mãe era católica, freqüentava a missa todos os domingos, mas costumava também ir tomar passes no CEIC, nas segundas-feiras à noite.

Naquela época havia prece na creche aos domingos e passei a freqüentar aquelas reuniões semanalmente. Depois de um ano de tratamento, recebi permissão para vestir branco e participei dos trabalhos do centro por mais de trinta anos.

Casei em 74 e continuei no centro. Saí do CEIC, no final de 96, junto com Dona Didi. Nessa ocasião, ficou estabelecido que encerrar-se ia linha de umbanda, no CEIC, e fui para outra casa onde fiquei alguns anos. Soube mais tarde que o centro havia voltado ao antigo modelo. Retornei depois de cumprida a minha missão lá na outra instituição e porque Pantera me disse que meu verdadeiro compromisso é com o CEIC.

Didi, em 08.11.2001.
Tinha muita afinidade com os trabalhos realizados pelos guias de Dona Didi e a acompanhava sempre. Pantera era muito rigoroso em relação à disciplina e à ética e sabia que podia contar comigo e com o Compadre Zé Moreira, assim nós éramos escalados com freqüência. Eu sabia que estávamos sendo amparados e não fazíamos comentários, tampouco trabalhávamos paralelamente em benefício próprio. Doávamos tudo de melhor e nos sentíamos muito bem ajudando o próximo.

Em relação à doença que me levou ao espiritismo, soube mais tarde que uma ex- namorada havia feito um trabalho contra mim há muito tempo atrás. Assim, os médicos nunca conseguiram descobrir o que eu tinha. Antes, eu não acreditava em espiritismo e fugia dos centros. Então, fui levado pela dor. Tive uma doença sem diagnóstico. Nenhum médico sabia o que eu tinha. Nunca tinha sentido nem dor de cabeça anteriormente. De repente, eu me vi depressivo e enfermo, quase sem força. Não sabia o que havia depois da morte e tinha medo de começar a freqüentar um centro e não conseguir cumprir os compromissos assumidos.

Durante o meu tratamento espiritual, fui sendo desenvolvido e quando percebi as práticas espiritistas já faziam parte da minha vida. Aprendi a não buscar recompensa, participo dos trabalhos e já me sinto feliz com esta oportunidade.

Edson Gomes sendo entrevistado para o blog da Dona Didi.
Impossível deixar de acreditar depois de ter vivenciado o espiritismo ao lado da mediunidade de Dona Didi. Algumas vezes eu comentava alguma coisa na rua e à noite chamavam a minha atenção, coisas que apenas eu sabia que havia dito. Assisti, por mais de três décadas, a vários trabalhos de cura impossíveis de serem descritos. Lembro-me de trabalhos de cura em que Pantera com simples pedaço de algodão embebido em álcool tirava bolas de cabelo do estomago de um irmão do centro e ele se curou a partir daquele momento.

Houve um trabalho que jamais esquecerei. Aconteceu em uma tapera, uma casa velha e abandonada em uma fazenda. Dona Didi entrou incorporada em um quarto cheio de cobras, depois deu uma volta ao redor, fiscalizando tudo. Então, Pantera ia à frente e nós em fila indiana observando as cobras passeando próximas dos médiuns. Nunca vi tanta cobra junta na minha vida e era incrível observar a força espiritual que emanava do ambiente. A gente saia fortalecido e sem palavras ante a magnitude da espiritualidade.

Tive dificuldade em aceitar o relacionamento de Dona Didi e com o senhor José Nascimento. Acho que a gente a admirava tanto, que pensávamos que ele não estava à sua altura. Inicialmente, ele era casado e sua esposa estava com câncer. Nós íamos lá aplicar-lhe passes. Ela desencarnou e meses depois o senhor José e Dona Didi se uniram.

Didi,  com neto Gustavo ao colo e José Nascimento Dantas, em 1979.
Mais tarde acabamos entendendo que esse relacionamento foi bom para ela porque ela precisava de condução para cumprir todas as suas obrigações como médium, dirigente de casa espírita, responsável pela Creche. O senhor José era uma pessoa difícil de relacionamento e a principio não consegui entendê-lo, mas, hoje, sei que certamente eles tinham algum compromisso a cumprirem juntos e o fizeram.

Dona Didi era uma pessoa honesta, trabalhadora, incansável, responsável, tinha uma força espiritual digna de nota. Quantas vezes participei de trabalhos dirigidos por ela e seus guias, às vezes estava chovendo, mas a entidade não permitia que a chuva atrapalhasse o trabalho e víamos chover ao redor, mas aquele círculo de luz onde estávamos permanecia seco.

Dona Didi era excelente em termos de relacionamento. Muito positiva, falava o que era preciso e só falava o necessário com cada um de nós. Era líder por excelência! É difícil dizer o que a Dona Didi significou em minha vida. Para resumir, digo que tudo o que sei aprendi com ela e com Pantera! Ela, como médium, era exemplo de dedicação, disciplina, de respeito e amor incondicional. Como pessoa, sei que Dona Didi era querida e admirada por todos, apesar de só ter convivido com ela junto à espiritualidade.

Filha Celina, netos André e Paula, genro Luiz e Didi, 1986.
Quando comecei ir ao centro, ainda era solteiro, levei a minha namorada ao núcleo dizendo a ela que me tornara espírita e eu continuaria freqüentando o centro. Ela concordou. Três meses após o casamento, ela começou a reclamar. Como ainda não tínhamos filhos, dei a ela a opção de nos separarmos, porque não deixaria a prática da doutrina como médium de umbanda. Ela acabou aceitando, mas passou 31 anos me cobrando. São provas relativas às nossas escolhas. Soube que Dona Didi também não era compreendida pelos familiares que não aceitavam que ela priorizasse as sessões em detrimento de compromissos sociais.

domingo, 14 de novembro de 2010

MEMÓRIAS DA DONA DIDI





DIDI, 1968.
27.03.1997

Novamente José e eu fomos a Caldas Novas. No dia 28, fizemos a nossa obrigação da Sexta-Feira da Paixão. Ficamos lá até dia 31 de março quando retornamos a Goiânia. Não pudemos ir à piscina, pois choveu quatro dias sem parar.

17.04.1997

Hoje, quinta-feira, Maria veio fazer faxina no meu apartamento. Eu tive que ir à chácara para pagar ao caseiro Clodomiro o seu salário. Sempre que vou à chácara volto contrariada. São muitos problemas, eu não dirijo, não tenho carro e só posso ir lá quando a Celina me leva. Preciso vendê-la para tirar essas preocupações de minha cabeça. Faz quatro meses que me ausentei do centro. Tive muita desilusão! Tenho muita saudade dos trabalhos de meus guias em favor da humanidade. O meu espírito não se aclimatou ainda com o corte dos trabalhos espirituais. Sofri muitas desilusões com os encarnados. Todavia, adoro os meus guias e sei que eles me amparam sempre!

Tenho sentido uma solidão incrível, uma tristeza imensa, uma horrível insatisfação! Além dos meus afazeres usuais, tenho lido muito, feito crochê, enfim, procuro preencher o meu tempo...

20.04.1997

José e eu fomos para o Rio e depois a Cabo Frio. Assistimos às comemorações de São Jorge no mar e ficamos encantados com a beleza daquela energia. Ficamos no Caribe Park Hotel, até o dia 27, quando retornamos de Cabo Frio ao Rio e, então, de volta a Goiânia.

02.06.1997

José, Didi, Bené e Raimundo, jun.1997.
Resolvi dar a José a estadia de dois a seis de junho, para passarmos, em Caldas Novas, o seu aniversário. Fomos de carro com minha filha adotiva Bené e seu marido Raimundo. Eles ficaram na cidade e nós no SESC. Os dias foram bons e ficamos na colônia que está muito bonita. Bené e Raimundo nos convidaram para almoçar em uma churrascaria no dia cinco, para comemorarmos o aniversário do José. Mas ele não aceitou alegando não poder comer algumas iguarias, devido à doença que o aflige atualmente. Na próxima segunda-feira, dia 9, ele irá ao médico para saber o que tem.

06.06.1997

Vendi a chácara para o professor Marçal Sebastião Alves. Graças a Deus fiquei livre das obrigações, pagar caseiro, engolir contrariedades, ter aborrecimentos com o Ministério do Trabalho, furtos, entre outras coisas. Perdi muito dinheiro, mas afinal acabaram as amolações. Além do mais, José sempre brigou comigo por causa de minhas idas à chácara. Ele tem estado muito doente e tenho que cuidar dele.



14.06.1997

Bené e Didi, 1998.
Fiz diversos exames para saber o que tenho, mas não farei nenhuma cirurgia. Tenho reumatismo, problemas na coluna e, às vezes, nos rins, pressão alta e sou cardíaca. Mas José não está melhor e tem ido a vários médicos e feito inúmeros exames, ainda sem definição de seu quadro. Seu último diagnóstico foi apenas gastrite ou úlcera, mas ele continua muito doente.

20.07.1997

Ione telefonou de Ribeirão Preto dizendo que o casamento de meu neto Bruno será no dia seis de setembro e contou que sua namorada está esperando um filho.

09.08.1997

Saímos de Goiânia no ônibus da Gontijo, rumo a Belo Horizonte. Lá chegamos às 21 horas. José marcou as passagens para Guarapari para 22 horas. Embarcamos e durante a noite sentimos um frio horrível. Chegamos às 7h da manhã e fomos de táxi para o Guarapari Hotel. Foi terrível a permanência em Guarapari. José continua enfermo e gemia de dor todo o tempo. Não pudemos aproveitar nada. Etelvina, esposa do Sebastião, nos visitou no hotel. Depois, fomos ao apartamento que eles alugaram. Resolvi com José trocar as passagens, antecipando a data da volta. Viemos no dia 13, chegando a Goiânia no dia seguinte.

07.09.1997

Air, Didi e Sônia, 1982.
Hoje é dia da pátria. José esteve fazendo exames e também um Raio X do intestino.Resultado: diverticulite, a doença de nosso ex futuro presidente – Tancredo Neves. Ele está muito magro, estou lhe ministrando alimentação de duas em duas horas. Faço caldo de carne ou frango e cozinho as verduras e legumes, batendo tudo junto no liquidificador. Preparo mingau de fubá, creme de milho, descasco frutas como maçã e mamãe, triturando também no liquidificador. Faço-lhe vitaminas de laranja, cenoura e beterraba e ele toma pela manhã, juntamente com suplemento alimentar e a medicação receitada pelos médicos. Tenho dado conta de cuidar dele mesmo sem ter empregada e tampouco me sentindo saudável.

15.09.1997

A vida aqui em casa está lamentável. José está a cada vez mais doente. Não durmo fazendo todo o serviço da casa e cuidando dele dia e noite. Agora, há pouco, cheguei do medico – Dr. João Neves Neto – que pediu mais exames, todos caros, além de receitar inúmeros remédios. Estou pensando em como resolver esta parada. Aqui em casa está uma farmácia, vou dar todos estes medicamentos para alguma obra de caridade.

17.09.1997

Estou muito desolada. O exame do José – a tomografia computadorizada – deu muito ruim, cirrose e vários tumores no fígado. Ele passa noite e dia acordado, não tem sossego e nem agüenta ficar sentado ou de pé. Estou esperando sua irmã Bebé chegar de Bauru e iremos ao médico para ele me orientar que devemos fazer. O médico nos disse que ele tem câncer no fígado em estado avançado.

20.09.1997

A vida tem sido terrível. Estou cansadíssima. José não dorme dia ou noite. Não tenho empregada, aliás, passei os últimos vinte anos com José fazendo todo o trabalho doméstico, administrativo, espiritual e assumindo todas as dificuldades.

25.09.1997

Bebé, irmã do José, me disse que virá aqui pela manhã para me ajudar. A outra irmã – Lisete – também virá durante o dia. Estou querendo contratar um enfermeiro para a noite e peço a Deus que me mande a pessoa indicada.

26.09.1997

Raimundo, Bené e Didi, em Caldas Novas, 1997.
Hoje faz três anos que meu genro Adevaldes faleceu. Estou passando pelas mesmas dificuldades que minha filha Clélia vivenciou. Peço a Deus que me ajude e que eu tenha condições de internar o José em um hospital e consiga pagar as despesas. São 20h 20 da noite e estou sozinha como sempre neste horário e oro a Deus para que eu vença mais nestas dificuldades.

29.09.1997

Hoje internei o José no Hospital São Domingos no Setor Bueno. Ele ficou lá até o dia três quando retornamos para casa. Consegui pagar as despesas e Bebé me emprestou uma cama de hospital. Desmontei a cama de casal e organizei tudo para o José.

Ao chegar preparei uma sopa de frango com cará que bati no liquidificador e José tomou toda. Ronaldo veio às 14h30 dar banho no José. Não sei como vou agüentar esta passagem de minha vida. Está muito difícil de suportar! Estou cansadíssima e não sei quando terei sossego. Peço ajuda a Jesus e confio Nele.

04.10.1997

Hoje novamente internei o José no Hospital São Domingos. Ele está pior. Não anda, nem fala. Ficamos lá até o dia sete, quando ele desencarnou!

Graças a Deus, dei conta de fazer tudo direitinho e seu enterro será amanhã, dia 8 de outubro de 1997, no meu jazigo no Cemitério Santana. Ele foi velado no salão 03 do Jardim das Palmeiras, das 22 h do dia 07 até ás 9h da manhã. Estou desolada e vim para o meu apartamento Trianon e estou achando aqui uma calamidade sem a presença física do José.

08.10.1997

Estou aqui no apartamento do edifício Trianon, o espaço que o José amava. Não sei o que será de minha vida de agora em diante.

16.10.1997

Maria, a minha passadeira que trabalha para mim há dezoito anos, veio passar comigo esta etapa custosa de minha vida. Tem sido horrível a falta do José! Estou pelejando para dar entrada na pensão do INSS do José e tem sido difícil. Também uma poupança de seis mil no banco Mercantil que exigiram um alvará, mas não sei se consigo. Vivemos juntos 21 anos, mas ele me escondeu alguns detalhes de sua vida. Por diversas vezes eu lhe fiz algumas perguntas, mas ele nada respondia.

Meus filhos querem que eu vá passar algum tempo em Salvador, na casa de minha amiga Elzinha e já está marcada a passagem para o dia o dia 24 de outubro. Talvez eu fique lá uns quinze dias, voltando no dia sete de novembro.

24.10.1997

Cheguei a Salvador pela manhã. A vida aqui tem sido uma monotonia terrível. Elza e Celso trabalham muito. Graças a Deus eu não os atrapalho em sua rotina.

25.10.1997

Fui à primeira comunhão da Carolina, neta da Elzinha. Foi muito bonita a missa toda cantada. Depois Tanit ofereceu uma mesa de salgados e doces no salão de festas do prédio onde moram.

26 a 31.10.1997

A vida tem sido bem aproveitada. Cedo, Elvira, mãe da Elzinha, e eu caminhamos pela praia. Após o almoço, Tanit sempre organiza um roteiro. Passeio na Lagoa Abaeté, visitas ao Solar do Unhão e na cidade de Salvador, tomar lanches, enfim, ela tem me ajudado muito a esquecer as minhas tristezas. Pena que eu não esqueça o meu Zezé. Ah, que coisa horrível... Que vazio, que falta, que saudade!

07.11.1997

Hoje faz um mês que José desencarnou e estou no avião da VASP, voando de volta a Goiânia. É horrível viajar sozinha, não sei o que será de minha vida. Não sei de nada. Cheguei a Goiânia à noite e Soninha, Celina e Júnior foram me esperar no aeroporto.