quarta-feira, 8 de setembro de 2010





Dona Didi sob a minha cosmovisão





“Em vez de tentar escapar de certas lembranças, o melhor é mergulhar nelas e voltar à tona com menos desespero e mais sabedoria”. Martha Medeiros



Didi cozinhando na Creche Casa do Caminho.
Tenho pedido a meus irmãos que escrevam suas impressões sobre a nossa mãe – Dona Didi – e, enquanto eles não o fazem, vou colocando o meu ponto de vista... Toda visão é relativa e é importante que todos participem para sermos fiéis à verdade. Afinal, o objetivo deste blog é trazer à tona a história de Dona Didi, para quem a conheceu, mas, sobretudo para os que não a encontraram nesta existência.



Didi não teve uma vida fácil! Todos nós desfrutamos das experiências necessárias à evolução de nosso espírito e certamente com ela não foi diferente. Todavia, deve ter sofrido bastante na infância. Muitas mudanças, sua adoção da qual só teve conhecimento ao se casar, união com um companheiro até então desconhecido, a ansiada maternidade que demorou a se concretizar, a enfermidade de meu pai, a assumência de sua mediunidade numa época em que ser espírita era discriminação, a viuvez com filhos ainda pequenos e o despreparo para assumir o papel de arrimo de família sem alternativa. Conciliar a vida doméstica com as obrigações de líder junto à espiritualidade tampouco é simples. Ela viveu tudo isso e com muita coragem!



Marco Antonio e Heitor, filho e bisneto de Dona Didi.
Ela jamais faltava às sessões ou chegava atrasada. Dizia ser mineira e foi sempre pontual com seus compromissos! Houve épocas que havia reuniões especiais, além das três regulamentais e ela nunca reclamava. Era o cenáculo aos domingos, Ramayara em dia determinado pelo Alto, trabalhos externos, assistência a enfermos... O que a espiritualidade recomendava era obedecido religiosamente. Difícil encontrar alguém com mais fé! Sua abnegação, sua disponibilidade era total! Quando havia problemas em casa, saía rezando, e sempre voltava com a certeza de que a espiritualidade olhava seu lar em sua ausência! E isso nem sempre era compreendido. Porém, ela tinha consciência de sua missão e a cumpria rigorosamente.



Além de médium, presidente da instituição por muitos anos, responsável pela obra do berço, pela creche, ainda organizava as palestras, angariava fundos para as obras assistenciais e estudava sempre. Era leitora assídua e psicografava também. Didi era líder e conseguia a colaboração de irmãos de fé e simpatizantes, com facilidade. Muitos não apenas a admiravam e respeitavam, mas realmente a adoravam!

Regina Lúcia - Londres, 9.9.2010.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Lembranças Sobre a Dona Didi


“Haverá um tempo exato
Em que o passado ecoará como cantiga de ninar
E trará de volta as lembranças adormecidas,
Mas sempre vivas.
Quando sentirmos saudades,
Haverá um sorriso...
Uma lágrima talvez...
E a estranha sensação de que nada,
Nada foi em vão”!
Lembro-me da alegria quando minha mãe arrumava seus cinco primeiros filhos e nos levava para um passeio até o coreto da Praça Cívica. Normalmente, ela carregava uma sacola com laranjas e bananas. Passávamos no mercado central que funcionava onde hoje é o Pathernon Center e ela comprava seis pastéis. Como era bom aquele cheirinho de fritura gulosa no saco de papel bege, molhado de gordura, e a expectativa da pequena aventura que empreendíamos! Ela dava as mãos para os dois menores, Sônia e Júnior, e os outros três se posicionavam de cada lado, também de mãos dadas com os irmãos. Eram uns sete ou oito quarteirões desde nossa casa até o local. Lá ela se sentava em um banco de granito e nós brincávamos na grama ao redor.
Repartia as bananas, descascava as laranjas para cada um, distribuía os pastéis e, às vezes, ainda comprava garapa. Sentíamos muito felizes com aquela liberdade vigiada! A gente não podia sair de casa a não ser para a escola e os passeios nos finais de semana em família. Papai construiu a nossa casa em um lote e o outro era devidamente cercado e plantado para nossas brincadeiras. Meu primo Luiz Roberto estava sempre lá em casa brincando com meu irmão, mas eram raras as oportunidades de encontrarmos outras crianças. Isso acontecia nos aniversários familiares, quando encontrávamos os primos, filhos de Tia Hilda e Tia Agda, irmãs de criação de mamãe. Papai tinha muitos irmãos, mas casou-se por último e demorou a ter filhos, portanto, os primos paternos eram muito mais velhos, exceto o Luiz Roberto, filho caçula de tio Venerando.
Dona Didi e seus netos, na Creche, 1985.

Aos domingos mamãe costumava fazer macarronada com galinha caipira. Meu organismo sempre teve dificuldade de aceitar carne e ver o frango com ossos era demais para mim. Ainda mesmo porque víamos as aves sendo mortas. Minha irmã Clélia e eu ficávamos com dó das galinhas e mamãe, muito brava, mandava que saíssemos, porque acreditava que nossa piedade fazia a galinha demorar a morrer!
Minha mãe resolveu tirar carteira de habilitação, mas tinha dificuldade em direção. O coronel que a examinou no DETRAN conhecia meu pai e lhe repassou a responsabilidade. – “Só vou aprová-la porque é sua esposa, mas é bom treiná-la mais um pouco!” Meu pai resolveu obedecer e no final de semana durante um passeio ao Córrego Santo Antônio, onde fazíamos piqueniques, minha mãe sentou-se ao volante e conseguiu fazer o carro subir em cima de um morundu de cupim! Meu pai a criticou e acabou desistindo de ser motorista...
Uma experiência ímpar que tive com a minha mãe – Dona Didi – foi uma espécie de psicofonia. Naquela época eu já era casada e mãe de três filhos. Lecionava em dois ou três estabelecimentos e corria o dia todo na luta pela sobrevivência. Dirigia um velho fusca de um lado para o outro da cidade. Estava sozinha naquela ocasião, rodando pela Avenida Paranaíba em direção ao Setor Oeste. Assim que cortei a Anhanguera ouvi nitidamente, em som alto, a voz de minha mãe me chamando e me assustei subindo com o carro no posto de gasolina da esquina, à direita. Então, não entendi o que havia acontecido, mas fui salva de grave acidente de carro.
Como sabemos, psicofonias são supostos sons, como vozes, que não são perceptíveis ao ouvido humano, mas que podem ser registrados por algum tipo de gravador de som. Acredita-se que seja um fenômeno parapsicológico de transcomunicação instrumental e que se trate de um sistema de comunicação com seres e entidades que não percebemos. Depois, contando o que aconteceu a minha mãe, ela me disse que naquele momento ela estava rezando por mim. Ela orava pelos filhos o tempo todo!

segunda-feira, 6 de setembro de 2010



Ainda, a Dona Didi, a senhora minha mãe!

Dona Didi, em 2001.

Didi era uma cozinheira nata! Algumas de suas filhas também cozinham, mas há alguns pratos que só ela sabia fazer com excelência! É o caso de sua famosa torta de maçã! Celina e eu tentamos reproduzi-la, às vezes, mas não chega aos pés daquelas que ela preparava. Lembro-me que ela aprendeu a fazê-la quando eu era bem pequena, com uma vizinha Dona Dora, que alugava a casa vizinha do lado da Rua cinco. Didi depois presenteou a Dª Dora com uma fatia e a mestra cuca a elogiou tanto que ela passou a dizer que era uma receita de família e até hoje acreditamos nisso!



Tenho muita saudade das saladas que ela preparava, era tudo verdinho, cozido com pouca água e com a panela destampada para não perder a cor original da verdura! Também, do peixe com pirão, de sabor inigualável! Ainda, do arroz com carne seca bem miudinha, o Maria Isabel! E os chás com biscoitos assados na hora que podíamos tomar quando a visitávamos em sua casa à tarde! Sempre que eu ia ao centro da cidade, reservava alguns minutos para uma passagem naquele oásis!



Quando meu pai adoecia com crises asmáticas, e minha mãe precisava ir ao centro, sozinha, ela me levava junto. Nessa época eu era bem pequena e ela quase me arrastava porque andava muito depressa a pé. Assim, eu assisti a muitos trabalhos, como observadora, sem muita compreensão do que via! Eram trabalhos na antiga Tenda, primeiramente, depois passes na casa de enfermos ou assistência espiritual por outras razões, trabalhos de cura realizados junto à natureza, verdadeiras bênçãos cujo alcance eu não podia ainda entender!

"As coisas são descobertas por meio das lembranças que se têm delas. Relembrar uma coisa significa vê-la - apenas agora - pela primeira vez."

Sei que nada acontece por acaso, repetindo um clichê, mas a sua saída prematura do centro a tocou muito! Ela perdeu quase ao mesmo tempo o companheiro de vinte anos e a razão maior de sua existência que era o CEIC! Seus filhos, razão primeira de sua vida, já estavam todos criados e com vidas próprias. Talvez, a espiritualidade lhe desse o livre arbítrio para que ela começasse a treinar o desapego, porque desencarnaria oito anos depois.



Ela tinha uma preferência pelos netos do sexo masculino, se bem que não admitisse! A exceção era a Renata, filha da gêmea Luiza, com quem sempre teve muita afinidade! Mas nas suas memórias, ela tece uma dedicatória a cada neto e bisneto, citados nominalmente.



Minha cunhada Terezinha disse-me que sonhou com ela recentemente e ela lhe contou que está trabalhando com a direção de um departamento na espiritualidade! Que Deus a abençoe e ilumine cada vez mais e, na medida do possível, que ela possa interceder por sua descendência, sempre que for necessário!


Regina Lúcia, Londres, 6.9.2010.

domingo, 5 de setembro de 2010

MAIS SOBRE A DONA DIDI



"É nosso dever lembrarmo-nos daqueles a quem devemos nossa existência." Publílio Siro


Eu devia ter uns seis anos quando minha mãe começou a freqüentar o centro – a antiga Tenda do Caminho. Minha mãe era líder por natureza e assim que assumiu a sua mediunidade, foi desenvolvendo-a de formas múltiplas, a ponto de surpreender até os familiares que tinham contato diário com ela.

Didi, em 1996.

Ela sempre quis trabalhar fora de casa, mas meu pai não admitia. Era a cultura machista da época. Assim, trabalhando com a sua mediunidade e com a filantropia no centro, ela pôde dar vazão ao seu anseio de sair um pouco do ambiente doméstico.


Foi mãe de uma dedicação extrema. Éramos sete filhos, além dos outros que passaram lá por casa. Meu pai estava sempre ajudando os outros e lembro-me de que durante algum tempo, um pessoal da Buona Espero esteve hospedado em nossa residência, durante meses. Eles pertenciam ao um grupo de idealistas espíritas que veio do nordeste para fundar um aprendizado agrícola na Chapada dos Veadeiros. Eram pessoas educadas, defendiam o esperanto como língua universal, e esbarraram com algumas dificuldades devido à burocratização. Tinham conseguido a doação de um terreno, mas o processo demorou a se concretizar. O casal Renato e Beth ficou hospedado no quarto de meu irmão mais velho – o Marco – que tinha ido estudar fora, em colégio interno de Belo Horizonte. Eles eram vegetarianos e Beth estava grávida. Minha mãe se desdobrava em cuidados com sua alimentação e a presenteou com o enxoval do bebê.


Minha mãe tinha um vocabulário próprio e nunca soubemos se ela o adquiriu na infância em Minas ou com a convivência com meu pai e sua família que vieram do nordeste antes de se radicar em Goiás. Nós nos prometemos fazer um levantamento de seu vocabulário para uma futura postagem.


Quando ela era informada de que algo era bom para a saúde de seus rebentos, não hesitava em colocar em prática. Uma vez soube que as ampolas de AD Forte, usadas como injeção, evitariam surtos de gripe. Pois bem, éramos acordados antes de seis horas, obrigados a abrir a boca e engolir o remédio durante o período estipulado.
Clelia, Sônia, Regina e Didi, natal de 2001.
Todos nós ingerimos Emulsão de Scott para abrir o apetite ou fava de sucupira dentro do vinho reconstituinte para gargarejos no caso de infecção de garganta. Também experimentei a cura de uma gripe com limão. Começava com o suco de um limão e iam aumentando as unidades a cada hora. Depois, o mesmo, em ordem decrescente. Acho que a gente sarava logo para evitar que o tratamento se prolongasse muito!
Um exemplo de sua dedicação aos necessitados foi a tarefa diária que cumpriu amorosamente durante meses a fio, dando banho em uma mocinha internada no Hospital do Pênfigo. Ela tinha uma doença de pele rara e todo o seu corpo em feridas. Minha mãe ia lá todos os dias lhe dar banho e trocar o pano que a cobria, porque ela não podia usar roupas. Gracinha sarou e minha mãe a ajudou com o enxoval do casamento. Lembro-me de que minha grinalda da primeira comunhão foi doada para complementar o seu vestido de noiva.
Regina Lúcia de Araújo